Quality by Design
A metodologia Quality by Design (QbD), em português "Qualidade Baseada no Projeto", foi criada durante a década de 1950 pelo engenheiro Joseph Moses Juran que defendia que todos os problemas que poderiam afetar a qualidade de um produto final estavam relacionados com a maneira que ele foi desenvolvido. Desta forma, a QbD define que durante o processo de desenvolvimento seja realizado estudos sistemáticos que avaliem quais são os fatores que podem afetar o desempenho daquele produto, considerando toda a fase de produção e o produto final. Esses fatores devem ser classificados e organizados conforme critérios baseados em gestão de risco da qualidade e controle de processos.
O principal propósito é ter um planejamento bem definido e estruturado, a fim de permitir uma maior flexibilização durante o processo de fabricação, e claro, a QbD é baseada em uma fundamentação científica sólida, ou seja, propõem que você deixe de lado quaisquer protocolos padronizados, estude muito todas as variáveis e inicie do zero o planejamento do seu projeto.
Atualmente, o maior desafio das indústrias farmacêuticas durante a produção de medicamentos é seguir à risca todas as exigências regulatórias durante o desenvolvimento dos produtos para comprovar que, além de ser seguro, aquele medicamento cumpre todas as especificações prescritas. A maioria dos processos farmacêuticos ocorrem em etapas independentes, embora uma área tenha interface com a outra, muitas vezes não há um planejamento e follow-up entre equipes de trabalhos. Por exemplo, duas exigências regulatórias difíceis de se trabalhar: Estudos de Estabilidade de Insumos Farmacêuticos Ativos (RDC 45/2012) e Estudos de Degradação Forçada (RDC 53/2015); muitos problemas que ocorrem durante os estudos de estabilidade e degradação poderiam ser evitados se houvesse estudos de pré-formulação, ou seja, um planejamento e estudos aprofundados antes de iniciar os processos de fabricação, pois isto permite prever possíveis falhas que prejudicaria a qualidade do produto final.
Etapas da Quality by Design
- Perfil do Produto (Quality target product profile, QTPP): define a relação entre o propósito do produto e o público alvo, nesta etapa deve-se estudar as vias de administração, dose, sistemas de liberação e outros aspectos que irá definir sua eficácia e segurança terapêutica.
- Atributos Críticos da Qualidade (Critical quality atributes, CQA): deve-se ter o conhecimento de todos os processos químicos, físicos, biológicos e/ou microbiológicos que o seu produto final, intermediário e/ou matérias-primas irão ser submetidos durante o processo de desenvolvimento. Os resultados experimentais desses processos podem ser correlacionados com as variáveis do projeto pré-planejado, já que ao fazer uso de indicadores de qualidade e ferramentas de gerenciamento de riscos, será possível medir a eficácia do processo produtivo no geral e priorizar apenas o que for relevante para garantir a qualidade do produto final.
- Atributos Críticos do Material (Critical material atributes, CMA): o foco são as matérias-primas utilizadas durante o processo de fabricação. Quando se adquire uma matéria-prima de um fornecedor é obrigatório vir todas as suas especificações químicas, físicas e biológicas, pois antes de utilizar para produzir o produto, é necessário certificar que todas as especificações correspondem com os dados do fornecedor e estão aprovadas para serem utilizadas. Além disto, é necessário avaliar a compatibilidade química entre substâncias, verificar possíveis reações indesejadas ao juntar várias substâncias com características físico-químicas diferentes e se não irá ocorrer alguma degradação que afete negativamente o tempo de vida útil do produto.
- Parâmetros Críticos do Processo (Critical Process Parameters, CPP): Durante o processo de fabricação, há parâmetros que possuem um papel tão significativo que interfere diretamente na qualidade do produto final, a QbD considera que a identificação desses parâmetros devem ser estudados e avaliados para verificar o risco que a sua variação apresenta na qualidade do produto final, assim, eu consigo padronizar partes do processo e verificar as características que não podem sofrer alterações.
- Espaço do Projeto (Design Space, DS): partindo do pressuposto que durante todo o desenvolvimento do produto há 'n' variáveis multidimensionais e parâmetros, e que as combinações e/ou interações desses dados podem influenciar a qualidade do produto final, deve-se estudar estaticamente o planejamento dos processos produtivos. Ou seja, desenhar todo o modelo de produção e fazer o controle de qualidade de cada etapa conforme dados estatísticos.
Ferramentas da Quality by Design
- Avaliação do Risco (RA): ferramenta utilizada com o propósito de discriminar quais são as fontes de variação que pode existir durante os processos produtivos, a fim de evitar riscos que prejudique todo o andamento do projeto, e também, evitar que no meio da produção não venha acontecer surpresas que faça você retomar o projeto do início.
- Planejamento Experimental (Design of Experiments, DoE): essa ferramenta é essencial para todo o planejamento do seu processo produtivo, requer muitos estudos e embasamentos científicos para planejar toda a parte experimental (estudos de pré-formulação e formulação; pesquisa e desenvolvimento farmacotécnico; pesquisa e desenvolvimento analítico; pesquisa e desenvolvimento microbiológico; validação de metodologias; estudos de estabilidade; estudos de degradação forçada; controle de qualidade; entre outros). Ressaltando que o propósito desta ferramenta é investigar os fatores que afetaria a qualidade do produto final e quais são os conjuntos de variáveis poucos conhecidas que deve-se atentar durante todo o processo de desenvolvimento, considerando que, se há planejamento e estudos do que será feito, o número de experimentos é reduzido drasticamente.
A implementação da metodologia QbD é uma tarefa árdua e trabalhosa para as indústrias farmacêuticas, pois não exige apenas novas tecnologias, mas sim, que paradigmas sejam quebrados e protocolos sejam abandonados, porque há uma mudança no conceito de qualidade do que a maioria das indústrias estão acostumadas a trabalhar. Em contrapartida, é uma metodologia que permite ampliar a possibilidade de produzir produtos farmacêuticos com qualidade, segurança e eficácia garantidas, já que todo o planejado é baseado em dados científicos e na previsão de riscos.
Referências e Saiba Mais:
Lachman L, Hanna SA, Lin, K. In: Lachman L, Lieberman HA, Kanig JL. Teoria e prática na indústria farmacêutica. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian; 2001. p.1357-1440.
BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Resolução nº 17 de 16 de abril de 2010 que trata das “Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos”.
BEZERRA, Mariana Palmeira; RODRIGUES, Leticia Norma Carpentieri. QUALITY BY DESIGN (QBD) COMO FERRAMENTA PARA OTIMIZAÇÃO DOS PROCESSOS FARMACÊUTICOS. Infarma - Ciências Farmacêuticas, [s.l.], v. 29, n. 1, p.5-12, 3 abr. 2017. Conselho Federal de Farmacia. http://dx.doi.org/10.14450/2318-9312.v29.e1.a2017.pp5-12.
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