Vamos falar sobre Vacinas e vacinação?
Texto de Flaviane Coutinho Edição: Marcelo Depólo Polêto
Você tem tanta certeza de que as vacinas funcionam, mas uma criança não vacinada ainda é uma ameaça para as crianças vacinadas... Interessante!
A vacinação é considerada uma das estratégias de política pública mais eficazes para a prevenção de infecções e epidemias [1]. Durante o mês de setembro, ocorreu a Campanha Nacional de Multivacinação com o objetivo de sensibilizar a população sobre a importância de estar com o cartão de vacinação em dia, com o slogan "Sua proteção começa com o cartão". No entanto, a historia da vacinação é marcada por êxitos e contratempos, se tornando um assunto polêmico na maioria dos países do mundo, onde muitos pais enfrentam o dilema : “É um risco vacinar assim como o é não vacinar” . Diante disso, no mês das crianças, trazemos pra vocês algumas informações sobre o tema.
A situação brasileira e o mercado nacional de vacinas
O Ministério da Saúde oferta gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) 17 tipos de vacinas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), para todas as faixas etárias, sendo 400 milhões de doses de imunobiológicos disponibilizadas anualmente, para combater mais de 20 doenças. O investimento na oferta de vacinas cresceu 225%, passando de R$ 1,2 bilhão, em 2010, para R$ 3,9 bilhões, em 2016. Além disso, o Brasil ainda exporta doses para mais de 70 países, sobretudo africanos, sendo referência mundial em produção, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas)[2,3].
Hoje o mercado brasileiro de vacinas é dominado por empresas farmacêuticas multinacionais que, atualmente, implementam - em conjunto com os dois principais produtores estatais (Biomanguinhos e Butantan) - contratos de transferência de tecnologia [2,3]. Esses contratos reduzem, pelo menos, em 30% o valor para o SUS de medicamentos e insumos estratégicos. Em 2016, o Ministério da Saúde lançou novas diretrizes, garantidos investimentos na ordem de R$6,4 bilhões do setor privado para incentivar produção nacional de medicamentos, insumos e tecnologias em saúde que gerará emprego, renda e benefícios aos brasileiros. Com os avanços tecnológicos que auxiliam a produção e aperfeiçoamento, atualmente, o Brasil possui grande domínio na pesquisa de desenvolvimento e produção de vacinas [3,4]. Só no Rio de Janeiro existem três laboratórios oficiais: Bio-Manguinhos, Fundação Ataulpho de Paiva e Instituto Vital Brazil. Em São Paulo, funciona o Instituto Butantan; no Paraná, o Centro de Produção e Pesquisa de Imunibiológicos e o Instituto de Tecnologia TECPAR; e em Minas Gerais, a Fundação Ezequiel Dias.
Produção de Vacinas e o Bioquímico
A produção de vacinas é um processo complexo e requer anos de muitos estudos que envolvem conhecimentos moleculares (interações moleculares, estrutura molecular, propriedades físicas e químicas), conhecimentos de produção bioquímica explorando o metabolismo e processo fermentativo de agentes biológicos e várias etapas de pesquisa clínica, além de controle de qualidade extremamente rigoroso e sofisticado em cada etapa de pesquisa, desenvolvimento e produção até a chegada ao consumidor final.
Nesse cenário, os Bacharéis em Bioquímica apresentam grande possibilidade de contribuição em:
-Pesquisa básica e aplicada e assessoria científica nas áreas de Imunologia, Vacinologia, Bioquímica e Biologia Molecular, processos produtivos de vacinas e demais imunobiológicos;
-Produção, garantia e controle de qualidade e melhoria contínua relacionados a vacinas e demais imunobiológicos;
-Gestão de laboratórios, de projetos e de inovações, transferências tecnológicas, assuntos regulatórios e patentes.
Problemas modernos na aceitação de vacinas pela sociedade
Ainda assim, embora os períodos de tempo tenham mudado as emoções e as crenças profundamente enraizadas - seja filosófica, política ou espiritual - que subjazem a oposição à vacina permanecem consistentes - e a imunização aplicada em crianças em particular - são questões polêmicas e controversas na atualidade, ganhando força no País com o surgimento frequente de movimentos Anti-vacinação. Para esses grupos, as vacinas são vistas como "grandes farmácias" ou fábricas para ganhar dinheiro, acreditando que um estilo de vida saudável é o suficiente para manter o sistema imunológico em ordem e combater a doença [5,6].
Esses movimentos estão sendo apontados como um dos principais fatores responsáveis por um recente surto de sarampo na Europa, onde mais de 7 mil pessoas já foram contaminadas [5]. No Brasil, os grupos são impulsionados por meio de páginas temáticas no Facebook, reunindo mais de 13,2 mil pessoas. Nesses espaços, os pais divulgam, sem base científica, supostos efeitos colaterais das vacinas compartilhando notícias publicadas em blogs, a maioria de outros países e em inglês, sobre as supostas reações e efeitos colaterais às vacinas e achados de Andrew Wakefield, agora desacreditados, que publicou um estudo concluindo que a vacina MMR (sarampo (measles), caxumba (mumps) e rubéola (rubella)) estaria ligada ao autismo [7,8,9].
Na verdade o que acontece, é que as vacinas não são perfeitas e podem apresentar reações adversas, havendo um conflito ético entre o interesse individual e o coletivo. Sendo as crianças responsáveis por carregarem de fato o ônus da vacinação em benefício da saúde pública quando são acometidas com reações adversas graves, valendo a pena ressaltar sendo esses casos extremamente raros, ficam alheias aos cuidados que deveriam ser oferecidos pelo Poder Público gerando a indignação sobe o ato de vacinar [10,11]. E para piorar as coisas, aqueles que estão contra as vacinas são ignorados e vitimados pela ciência e pela mídia. Galera, precisamos entender que como qualquer pai responsável, eles estão tentando proteger seus filhos do que veem como um grave perigo para sua saúde.
Em realidade, os benefícios das vacinas para a saúde pública são indiscutíveis, no entanto acredito que o futuro da imunização está estritamente relacionado com a credibilidade das vacinas, sendo necessário um esforço concentrado no sentido de melhorar estudos que possibilitam menores reações adversas e uma efetiva comunicação em todos os níveis sobre os benefícios e os riscos associados à vacinação. Por fim, concordo com Heidi J Larson, PhD em London School of Hygiene e Tropical Medicine:
“As vacinas são uma das melhores invenções da história da saúde e salvaram milhões de vidas. Elas não são perfeitas e nunca serão. Mas, como todas as intervenções científicas e de saúde, você precisa continuar aspirando a melhorar o que você tem para melhorar. E, entretanto, continue a usar as melhores ferramentas que temos para prevenir doenças e salvar vidas”.
Referências
1.Centers for Disease Control and Prevention (1999). Ten great public health achievements -- United States, 1900-1999. MMWR. Atlanta, GA: Centers for Disease Control and Prevention (CDC), 48 (12):241-243.
2. Coelho, N (2017). Ministério da Saúde amplia vacinação em todas as faixas etárias. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/principal/secretarias/svs/noticias-svs/27749-ministerio-da-saude-amplia-vacinacao-em-todas-as-faixas-etarias-2. Acesso em: 30 Setembro 2017.
3.Portal Brasil (2017). Brasil é referência mundial em produção de vacinas. Disponível em:www.brasil.gov.br/saude/2017/09/brasil-e-referencia-mundial-em-producao-de-vacinas. Acesso em: 23 Setembro 2017.
4.Domingues L. (2013). 40 anos do PNI: de Oswaldo Cruz às PDPs. Disponível em: https://www.bio.fiocruz.br/index.php/noticias/588-40-anos-pni-de-oswaldo-cruz-as-pdps. Acesso em: 30 Setembro 2017.
5. Cambricoli F, Palhares I (2017). Grupos contrários à vacinação avançam no País e preocupam Ministério da Saúde. O Estado de São Paulo. Disponível em: http://saude.estadao.com.br/noticias/geral,grupos-contrarios-a-vacinacao-avancam-no-pais-e-preocupam-ministerio-da-saude,70001800099. Acesso em: 30 Setembro 2017.
6. Gander K (2017). World Immunization Week: The Rise Of The Anti Vaccination Movement And What It Means For Public Health. Disponível em: http://Www.Independent.Co.Uk/Life-Style/Health-And-Families/World-Immunisation-Week-Anti-Vaccine-Movement-Rise-Vaxxers-Mmr-Autism-Scare-Big-Pharma-Government-A7705806. Acesso em: 30 Setembro 2017.
7. Alencar M (2017). Grupos Anti-vacinação Crescem no Brasil. Disponível em: http://minasfazciencia.com.br/2017/05/25/grupos-antivacinacao-crescem-no-brasil/. Acesso em: 30 Setembro 2017.
8.History of Anti-vaccination Movements. Disponível em: https://www.historyofvaccines.org/content/articles/history-anti-vaccination-movements. Acesso em: 30 Setembro 2017.
9. Deer, B (2011). How the case against the MMR vaccine was fixed. BMJ, 342:c5347.
10.Fine P, Eames K, Heymann D L (2011). "Herd Immunity": A Rough Guide. Bacines; 52(1):911-916.
11. Lessa S L, Schramm F R (2015). Individual versus collective protection: bioethical analysis of the national program of mass child vaccination. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, vol.20,1.
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