As diferenças entre os cursos de Bioquímica e Farmácia

por | jul 16, 2017

BIOQUÍMICA E O BACHAREL EM BIOQUÍMICA

 

     O Bacharelado em Bioquímica é  focado em compreender e utilizar tecnologicamente os processos químicos que ocorrem nos diferentes organismos vivos conhecidos, tal qual a definição e escopo da ciência e tecnologia Bioquímica. É um curso de forte carga de ciências químicas, exatas e tecnológicas, com flexibilidade na carga de ciências biológicas. Ou seja, trata-se da aplicação dos conhecimentos e tecnologias das ciências químicas dentro do contexto da biologia e seus diferentes ramos, que antes estavam espalhados em diferentes profissões.
     O propósito da existência do curso de bioquímica está na unificação dessas diferentes visões e fragmentos da bioquímica: a bioquímica científica (pesquisa) , a bioquímica industrial, a bioquímica clínica e toxicológica, a bioquímica de alimentos e bromatologia, a bioquímica educacional, a tecnologia bioquímica e biotecnologia, e mesmo a bioquímica comercial (marketing, gestão etc). Portanto, é um curso que abrange  áreas tradicionais e já consolidadas, atuando como  profissional da química, e também áreas inovadoras e que estão sendo implantadas no país, atuando como  profissional da biotecnologia (afinal, partimos da química e da química da vida para a biotecnologia).
     O mercado de trabalho para o profissional bioquímico está em expansão e presente em todo o território nacional, assim como a utilização da tecnologia bioquímica. É necessário deixar claro também que tanto o Bacharel em Bioquímica quanto o seu mercado de trabalho vão muito além da biotecnologia, sendo esta apenas uma de suas inúmeras atuações.  Atualmente, as melhores oportunidades técnicas estão na bioquímica de alimentos e bromatologia, processos fermentativos industriais, controle de qualidade microbiológico e físico-químico, bioquímica clínica e diagnóstico molecular, análise e tratamento de águas e esgotos, biotecnologia, ingredientes para cosméticos e alimentos. Já as melhores oportunidades de atuação gerencial estão na gestão da qualidade, gestão laboratorial, gestão de projetos e inovações, vendas técnicas e marketing de produtos científicos e laboratoriais.
    Sugerimos aprofundar conhecimentos em nosso site.

Por que o curso de Bioquímica foi criado?

 

O curso de Bioquímica foi criado na Universidade Federal de Viçosa (UFV) em 2000, baseando-se em seis premissas:

  1. O mercado de trabalho emergente na área de bioquímica e biotecnologia exige uma formação sólida e única, que antes estava dispersa em cursos e profissões diferentes, como farmácia, agronomia, biologia, medicina, química, engenharia de alimentos e engenharia química;
  2. Inspiração do prof. Mares Guia, fundador da primeira indústria de bioquímica e biotecnologia nacional e prof. da UFMG, um dos maiores expoentes da bioquímica nacional. Ele considerava que um curso de graduação seria o desdobramento natural do fortíssimo crescimento da bioquímica brasileira no panorama científico-tecnológico nacional e internacional;
  3. Exemplos da graduação em Bioquímica existentes na Argentina, Chile, México, EUA, Alemanha, Reino Unido, França e Portugal, nos quais os campos de atuação do bioquímico são bem definidos e diferentes do farmacêutico e do analista clínico;
  4. Caráter inovador e estratégico para o Brasil;
  5. Necessidade de se formar um profissional com fortíssimo embasamento de ciências químicas na interface com a biologia e suas aplicações na indústria, clínica, ensino, pesquisa científica e áreas comerciais (gestão, regulações, patentes etc);
  6. Corrigir a mistura de perfis e conceitos da reforma curricular de 1969 da Farmácia, que criou o farmacêutico-bioquímico e a confusão entre os conceitos de bioquímica e análises clínicas. E assim permitir que o farmacêutico se dedique mais a sua área de atuação principal (o medicamento e interação medicamento-paciente) e o Bioquímico se dedique mais aos diversos aspectos da bioquímica.
   O curso de Bioquímica da UFV foi reconhecido pelo MEC em 2004 e aceito dentro dos Conselhos Regionais dos Profissionais da Química (sistema CRQ/CFQ) no mesmo ano. Os frutos desse início são visíveis hoje:
  • A proposta do curso e profissão foi aceita, tendo surgido os cursos de Bioquímica na Universidade Federal de São João del Rey (UFSJ) e na Universidade Estadual de Maringá (UEM);
  • Ex-alunos (egressos) se tornaram pós-graduandos ou professores universitários em universidades públicas e privadas espalhadas pelo país, outros se tornaram profissionais concursados em diversos níveis em instituições como Embrapa, Inmetro, Policia Civil, Fiocruz, SAAE etc.. Outros estão trabalhando ou já trabalharam em empresas e indústrias privadas, como Vallée, Natura, VTT, BIOMM, TIAL alimentos, Thermo-Fischer, dentre outras. E também aqueles que criaram empresas como CentroInova, CellSeq e Invita Nutrição;
  • Avaliação do curso de Bioquímica da UFV como 5 estrelas pelo Guia Abril do Estudante.
   Vale ressaltar que nas três graduações em Bioquímica existentes hoje, diversos são os professores/pesquisadores que se graduaram em farmácia. Além desses, diversos farmacêuticos contribuíram para a formação de bioquímicos em pós-graduações fora da UFV, UFSJ e UEM. Todos são unânimes em dizer que o curso de farmácia tem outro propósito e os conhecimentos adquiridos são de outro escopo, sendo inadequados para atender ao mercado de bioquímica e biotecnologia, assim como ocorre com outras graduações como química, engenharia química, biologia, agronomia ou medicina.  Pela necessidade da criação de um currículo focado nessa demanda do mercado de bioquímica e biotecnologia, foi necessário a criação de um novo profissional.

O BACHARELADO EM FARMÁCIA (GENERALISTA)

 

 

O Farmacêutico é o profissional da saúde que trabalha com o fármaco e o medicamento nos aspectos social, científico e tecnológico, sempre em função da saúde humana e no Brasil, dentro e fora do contexto do SUS. O conceito de fármaco, de uma forma simples, é qualquer composto químico com interesse medicinal, seja positivo a saúde (fármaco-medicamento) ou negativo a saúde (tóxico), presente em medicamentos, vacinas, soros, cosméticos, saneantes e alimentos. No escopo de atuação do farmacêutico estão a pesquisa, desenvolvimento, produção, manipulação, armazenamento, controle e garantia de qualidade de fármacos/medicamentos em todos os níveis de atenção à saúde (conforme SUS) e também o planejamento, administração e gestão de serviços de assistência e atenção farmacêuticas, individual e coletiva.

Atualmente a profissão farmacêutica é marcada pelos conceitos de assistência farmacêutica e atenção farmaceutica] A assistência farmacêutica engloba todo o ciclo do medicamento antes do uso pelo paciente, trazendo a preocupação com a saúde do usuário final para as etapas de pesquisa, desenvolvimento, produção, formulação, qualidade, conservação, transporte, distribuição e seleção, difusão de informações e educação continuada para profissionais da saúde e pacientes. Já atenção farmacêutica caracteriza-se pelo relacionamento direto entre farmacêutico e paciente visando o acompanhamento e uso racional da farmacoterapia, incluindo: atendimento farmacêutico (interação farmacêutico-paciente), fornecimento de medicamentos (dispensação), acompanhamento da farmacoterapia e intervenção farmacoterapêutica.

Como uma consequência natural das análises químicas, clínicas e biológicas na busca de fármacos ou tóxicos, os farmacêuticos entraram na área de análises clínicas e de alimentos, através da reforma curricular de 1969. Entretanto, um equívoco introduzido na reforma curricular em 1969, e somente corrigido na reforma de 2002, se tornou evidente: o uso do termo análises clínicas como sinônimo de bioquímica e analista clínico como sinônimo de bioquímico. Veja bem: é importante ressaltar que não é que a presença de farmacêuticos nas análises clínicas esteja errada, mas sim que o termo utilizado estava equivocado. Defendemos o uso do termo farmacêutico analista clínico e reconhecemos a importância destes profissionais para as análises clínicas e saúde do brasileiro.

 

ANÁLISE CURRICULAR: DIFERENÇA ENTRE BIOQUÍMICA E FARMÁCIA

 

 

De um modo geral, a reforma curricular de 2002 do curso de farmácia diminuiu a quantidade de disciplinas e carga horária de exatas e ciências químicas, abrindo espaço para disciplinas da área de saúde relacionadas a atenção e assistência farmacêutica. Por outro lado, o curso de Bioquímica manteve a base geral de exatas e ciências químicas existentes nos cursos de química e nos antigos cursos de farmácia industrial e farmácia-bioquímica existentes anteriormente a reforma de 2002 (inclusive alguns farmacêuticos enxergam o bacharelado em bioquímica como o sucessor natural do antigo farmacêutico-industrial e do antigo farmacêutico-bioquímico).

Recentemente, em Outubro/2017, uma nova reforma foi realizada, destacando a formação do farmacêutico em 3 eixos: 1-Cuidados com Saúde 2-Tecnologia e Inovação em Saúde 3- Gestão em Saúde. A distribuição do tempo de teoria de estudo deverá ser 50% no eixo 1, 40% no eixo 2 e 10% no eixo 3. Já a distribuição do tempo de estudo prático, em estágios, deverá ser 60% relacionados a assistência farmacêutica, fármacos e medicamentos, 30% em análises clínicas e 10% em especificidades regionais. Como pode ser visto no site do MEC aqui, a reforma de 2017 consolida em definitivo o farmacêutico como profissional da saúde e do medicamento.

Um exemplo de atuação em cuidados com saúde é a assistência farmacêutica e  a dispensação de medicamentos (no balcão de farmácias e drogarias),visando o uso racional do medicamento e o acompanhamento da farmacoterapia do paciente, como por exemplo aqui, acerca dos consultórios farmacêuticos e da interação farmacêutico-paciente-demais profissionais de saúde.

Além das diferenças com relação ás ciências exatas, os dois cursos também apresentam diferenças nas ciências biológicas utilizadas! Para o farmacêutico esse componente é bastante voltado à área biomédica e de saúde, uma vez que o farmacêutico é um profissional da saúde. Já no caso do bioquímico, como profissional da química e da biotecnologia, as disciplinas biológicas ajudam a direcionar o profissional para as diversas áreas da bioquímica, como a bioquímica agrária, bioquímica de alimentos, bioquímica industrial e bioprocessos, tecnologia bioquímica e biotecnologia , bioquímica ambiental e bioquímica médica e clínica.

No quadro abaixo, fica fácil verificar a diferença entre os dois cursos, ao explicitarmos as disciplinas definidoras da identidade de cada um dos cursos.

 

 

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ANÁLISES CLÍNICAS: ONDE BIOQUÍMICOS E FARMACÊUTICOS SE ENCONTRAM

 

Se para o farmacêutico a entrada no mercado de análises clínicas foi uma consequência natural das análises químicas, clínicas e biológicas na busca de fármacos ou tóxicos, para o bioquímico a entrada neste mercado também foi uma consequência natural de sua habilidade nas análises químicas, biológicas, bioquímicas e biotecnológicas e também consequência natural do equívoco existente entre os termos bioquímica e análises clínicas, conforme dito acima. Cumpre lembrar que esta área nunca foi exclusiva de nenhum profissional e que atualmente atuam nesta área: farmacêuticos, biomédicos, biólogos, químicos e bioquímicos, cada qual com sua expertise.

Entretanto, se para farmacêuticos e biomédicos as disciplinas de análises clínicas são obrigatórias, para o bioquímico elas são optativas, compondo uma enfase no currículo que deve ser complementada com uma especialização ou mestrado profissionalizante em análises clínicas (veja o quadro abaixo mostrando como o Bioquímico tem capacidade de atuar em Análises Clínicas). O papel do bacharel em bioquímica está bem descrito em outras postagens neste site.

 

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CONCLUSÕES : PORQUE O FARMACÊUTICO DEVE SE ALIAR AO BIOQUÍMICO PARA DIFERENCIAR OS CURSOS E PROFISSÕES PERANTE A SOCIEDADE?

 

   Portanto, fica claro a necessidade de diferenciarmos o bioquímico do farmacêutico, sem fazer juízo de valor se este é melhor do que aquele, mas apenas diferente! E contamos com você, farmacêutico, nessa diferenciação, afinal:
1)    Os dois cursos e profissões convivem na UFSJ e na UEM, com campos de atuação bastante definidos, ou seja, está se reproduzindo no Brasil a diferenciação verificada em outros países que possuem as duas profissões, como Argentina, EUA, Reino Unido, Portugal dentre outros.
2)  Já se passaram quase duas décadas da criação do bacharelado em Bioquímica e diversas turmas já se formaram além de outros 2 cursos terem sido criados. Não é possível mais voltar no tempo e tentar parar o processo de consolidação do bioquímico.
3)    A sociedade e os próprios farmacêuticos já estão cada vez mais conscientes de que não se deve considerar bioquímica como sinônimo de análises clínicas.
4)     A sociedade e os próprios farmacêuticos já estão cada vez mais conscientes das diferenças de perfil para os bioquímicos: Farmacêutico é profissional da saúde, em especial após a reforma de 2017, enquanto Bioquímico é profissional da química!
5)    Deve-se a todo custo evitar editais como este, que requer graduação em bioquímica para funções de farmacêutico (isto é, aquelas referentes ao medicamento):
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(o edital completo pode ser encontrado aqui)
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   Por fim, observamos que a nossa comunidade profissional de bacharéis em bioquímica (egressos) conseguiu vitórias recentes porque soube demarcar claramente a própria identidade no mercado de trabalho e nos processos seletivos de universidades e além disso soube transformar promessas e potencialidades em realidade, como profissional da química de ampla atuação que somos. Recomendamos a todos os bacharéis em Bioquímica a reafirmarem claramente sua identidade profissional e assumir a responsabilidade individual pelo desenvolvimento da profissão. Por isso, nós do Movimento Bioquímica Brasil, recomendamos fortemente o curso para quem se interessa por biologia e química. Ele pode ser cursado na Universidade Federal de Viçosa (MG), na Universidade Federal de São João del Rey (MG) e também na Universidade Estadual de Maringá (PR).
   Esperamos ter sanado suas dúvidas. Um forte abraço!
   Para este texto, analisamos durante mais de um ano, projetos pedagógicos, grades curriculares e escopo de atuações de absolutamente todos os cursos de bacharelado em Farmácia das principais universidades públicas e privadas no país, além dos cursos em bacharelado em bioquímica.
Esclarecemos também que mantemos contato com inúmeros bacharéis em farmácia e possuímos relações diplomáticas com os farmacêuticos. Entendemos que os perfis dos dois profissionais são diferentes e devem estar devidamente esclarecidos a sociedade brasileira e que a a colaboração entre ambos é vital para  o país.

 

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Bioquímica Brasil

O movimento Bioquímica Brasil foi fundado em 2014 por egressos e estudantes dos cursos de Bioquímica.

bioquimicabr@gmail.com

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