Grandes Centros de P&D: Melhoramento Genético Vegetal na Souza Cruz
O Christiano Simões, é bioquímico pela UFV (2001-2005), mestre em bioquímica agrícola pela UFV, doutor em genética pela UFMG e pós doutorado em bioinformática também pela UFMG e possui MBA em gestão de pessoas, pela FGV. Atualmente é líder do programa de melhoramento genético e convencional de plantas da Souza Cruz (British Tobaco).
- (Bioquímica Brasil) Christiano, nos conte um pouco de sua trajetória acadêmica e profissional.
(Christiano) A minha trajetória acadêmica começou na graduação em bioquímica da UFV. Entrei na primeira turma, a de 2001. Naquela época, para ser bacharel em bioquímica a única opção no Brasil era o curso da UFV. Como era um curso novo, muitas disciplinas e atividades que fazíamos ainda estavam sendo adaptadas à nossa realidade, bem como a própria grade de disciplinas. Porém, mesmo com o ineditismo do curso, as disciplinas e os trabalhos propostos atingiram um excelente nível de qualidade. Ainda na graduação comecei a participar de estágios para me ajudaram a definir em qual área da bioquímica eu iria atuar. Em 2002, durante uns 8 meses participei de um estágio no hospital de Viçosa no área de análises clínicas. Foi uma excelente oportunidade para aprender e que me fez decidir, definitivamente, que eu trabalharia com plantas. Então, em 2003, comecei a fazer estágios na Embrapa Milho e Sorgo de Sete Lagoas –MG, quando tive contato pela primeira vez com melhoramento genético de plantas.Ao terminar a graduação em 2005 resolvi ficar mais um ano na Embrapa como “Trainee”. Somente em 2006 decidi continuar os estudos e entrei no mestrado em Bioquímica Agrícola da UFV, mas toda parte prática foi realizada na Embrapa. Em 2008, entrei para o Doutorado na UFMG. Eu julgava importante mudar de instituição de ensino para aprender com pessoas diferentes e culturas diferentes. Hoje tenho certeza que essa foi uma decisão correta, mas naquela época não foi muito fácil entender isso. Ao final do Doutorado eu tive contato com a bioinformática, pois tive que analisar um grande volume de dados para finalizar a tese. Nessa época eu já lecionava algumas disciplinas numa faculdade particular em Sete Lagoas. Dividia o tempo entre a tese, a Embrapa e as aulas. Porém, era a bioinformática que chamava a minha atenção. Então acabei o doutorado e comecei logo um treinamento Pos Doc em Bioinfo, também na UFMG e matendo as aulas em Sete Lagoas. Não durou muito o Pos Doc, eu havia sido chamado para uma vaga de pesquisador sênior na DuPont Pioneer. Aceitei o convite e fui morar em Palmas – TO. Na Pioneer, eu era responsável pelo suporte em bioinformática e em biologia molecular aplicados às culturas de milho e de soja nos programas de melhoramento no Brasil e na Argentina. Então, quando ainda era pesquisador na Pioneer, recebi uma proposta da Souza Cruz para liderar um programa global de melhoramento genético de tabaco e que seria conduzido aqui no Brasil. Resolvi aceitar esse desafio e é essa a minha função hoje.
- Como você aplica os seus conhecimentos adquiridos na graduação em Bioquímica no seu dia- a-dia profissional?
As atividades que executo são, essencialmente, de pesquisa na área de melhoramento genético. Para essas atividades é necessário ter conhecimento em genética, estatística, biologia molecular, bioinformática, fitopatologia, química analítica, cultura de tecidos. Estamos sempre discutindo os trabalhos e, para isso, é preciso ter uma boa base científica. As melhores decisões são tomadas com maior nível de informação e conteúdo. Portanto, a aplicação do conhecimento é para tomar a melhor decisão possível. Essa decisão será aplicada a uma solução que seja relevante para sociedade e para companhia.
- O que te fez optar pelo P&D na indústria agrícola, como a Souza Cruz, e não se tornar professor de universidade?
Durante a minha trajetória profissional pude experimentar empresas privadas e públicas, além da docência. Posso afirmar com segurança que todas essas possibilidades são muito boas. A minha decisão por trabalhar em empresas privadas não exclui a possibilidade de, no futuro, exercer a profissão em uma empresa pública ou universidades. Acredito que as oportunidades devem ser aproveitadas da melhor maneira possível, pensando sempre nos dois lados (pessoal e na empresa). Nos últimos 4 anos tenho tido oportunidade de trabalhar em grandes empresas (Pioneer e agora BAT – Souza Cruz) e a minha adaptação a esse mundo corporativo tem sido positiva. Portanto, essa adaptação tem pesado muito para que eu continue trabalhando e me dedique nesse caminho que tenho percorrido.
- Você teve a oportunidade de transitar pelo ambiente de trabalho de universidades federais, Embrapa, universidade particular e duas indústrias agrícolas (Pioneer Hi Breed e Souza Cruz). Como você percebe a diferença de objetivos e ambiente de trabalho em cada um?
Costumo fazer uma comparação com a vida em família quando falo desse assunto. Cada família tem sua origem e suas características particulares. Por exemplo, em algumas famílias é comum servir o jantar em um horário bem definido e as pessoas se sentam à mesa para conversar e jantar, sem celulares, sem TV. Por outro lado, existem famílias que cada pessoa se serve e vai sentar onde julgar mais apropriado, uns sentam em frente à TV, outros vão pro quarto, outros permanecem ao celular e se alimentam ao mesmo tempo. Agora, imagine que um membro da primeira família foi convidado para jantar na casa da segunda família. Ele não iria perceber algo estranho? Mudar de empresa é mais ou menos assim. O sentimento é parecido com o da pessoa que foi jantar em outra casa. Porém, não há certo ou errado nessa história, há culturas diferentes. É comum demorar um tempo para acostumar, mas depois aprendemos a viver em família novamente.
- Quais as vantagens da formação em Bioquímica que você percebe como determinantes para o P&D vinculado a indústria agrícola? E quais as habilidades não-técnicas (humanísticas) necessárias para se ter sucesso nessa área?
O graduado em bioquímica tem uma vantagem no entendimento profundo dos processos. Quando converso com um bioquímico sobre ciência, a sensação que tenho é que a discussão se aprofunda um pouco mais nos quesitos técnicos. Por outro lado, percebo que a visão técnica muito apurada não é o suficiente. É importante ter uma visão estratégica que implica num planejamento em longo prazo e com foco no resultado prático para sociedade ou companhia. Nesses aspectos ainda percebo um déficit na nossa formação de bioquímicos. Gostaria de saber as habilidades para ter sucesso! Por favor, me contem!! Brincadeiras à parte, o mercado atualmente valoriza muito a figura do líder em detrimento a do gerente. Conceitualmente, o líder é pessoa com capacidade de planejar as atividades para o futuro, confia e valoriza a equipe, sabe ouvir, dá e recebe feedback, não é egoísta, sabe delegar as atividades e, essencialmente, comunica-se com eficiência.
- Você possui um MBA em gestão de pessoas e coordena uma equipe de melhoramento no Brasil e sua integração com outras equipes do exterior. Você recomendaria a todo bioquímico a ter noções de gestão, mesmo aqueles que pretendem seguir carreira acadêmica?
Acredito que todos nós, em algum momento somos gestores. Mesmo as pessoas que trabalham em casa, como as donas de casa, têm que fazer a gestão de recursos e suprimentos, além de planejar as próximas compras e antecipar as demandas. Recomendo noções de gestão para todos, não só para os bioquímicos.
- Você acha que seja necessário alguma alteração na grade de disciplinas?
Não sei se alteração na grade de disciplinas é o melhor caminho. Talvez não. Na graduação em bioquímica havia a possibilidade de cursar disciplinas eletivas na área de gestão, porém quase ninguém procurou por isso. Em minha opinião, o problema é um pouco maior que as disciplinas que são oferecidas. O problema é que a academia brasileira ainda está muito distante das empresas e da sociedade. Publicamos muito mais artigo do que patenteamos ou geramos segredos comerciais. Precisamos despertar nas pessoas a necessidade de integrar academia e sociedade como um todo. Assim, talvez as pessoas busquem oportunidades na área de gestão por si só e não por que a grade de disciplinas mudou.
- Que conselhos daria aos bioquímicos que estão começando agora?
Há uma palavra que está muito na moda que é resiliência. A capacidade de superar dificuldades nos torna diferenciados. Porém, não somos capazes de superar as dificuldades se não percebermos que vale a pena. Só sabemos se vale a pena quando temos gostamos do que fazemos. Então diria o seguinte: Vá em busca do que realmente gosta, supere as dificuldades com resiliência e assim a recompensa virá. Não faça o caminho inverso!
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